Dentre os animais, nós - humanos – podemos fazer escolhas racionais e construir um modo cultural de viver. Podemos escolher a vontade de cooperar, a prática da bondade, ... o dinheiro como deus ou "a doença como caminho". Podemos cultivar a avareza, a gula, a luxúria, o ódio, ... abusar de mansos, de fracos, de crianças e de idosos; ser intolerantes, usar armas, intimidar pessoas, fazer intrigas, promover guerras, conquistas, ... Pessoas simples – muitas vezes, sem diploma, com limitações físicas e com poucos recursos financeiros – se unem para ajudar amigos, desconhecidos e, até, inimigos, na esperança que mais gente entre no mutirão do bem. Por outro lado, predadores desfaçados exploram familiares, vizinhos e governos para comprar e esbanjar. Devassos se entregam a prazeres desenfreados, abusando dos outros e desmoralizando a vida. Quando alguém cai na escuridão do fanatismo, segue a voz que arrasta para o abismo da alienação. Quem segue leis naturais, com simplicidade e desapego, tem maiores chances de viver em paz e harmonia. Alguns fazem escolhas iniciais na infância ou na adolescência; outros, escolhem aos poucos, quando tomam consciência da própria responsabilidade, ou ... só na velhice... Quem nunca escolhe acaba escolhido e, alienado e manipulado, segue o fluxo social, rumo ao fracasso.
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O PORVIR E O POR VIR
Vivo uma vida singela, entre árvores e pássaros, ouvindo a música das cachoeiras, cultivando a horta e o jardim, usufruindo uma aposentadoria tranquila, que possibilita passar algumas horas lendo ou escrevendo.
Amanhã …?
Viverei como escritor-sitiante até quando perder o domínio sobre o corpo e sobre a mente; por enquanto, cuido da casa e do corpo e, com a ajuda do Vanderlei, consigo dar conta dos trabalhos de manutenção do Sítio Itaguá. Depois… quem sabe alguém que ame a natureza queira continuar a obra? Acredito que sempre haverá utópicos dispostos a ‘dar a vida pela natureza’.
Morrer…
Se a morte repentina me apagar, minha velhice será breve…. Caso tenha uma morte longa, dependerei de cuidadores que caibam no meu orçamento e de alguém que administre a situação.
Prefiro morrer ‘na luta’, peleando, de pé. Se acaso as pernas fraquejarem, continuarei a caminhar sobre muletas, rodas ou esteiras, pois, enquanto vivo, quero andar.
Pode a mente sofrer períodos de descontinuidade ou ser desligada definitivamente; sei que pode ocorrer. Quando isso acontecer, peço o favor: desliguem o corpo também. Quando perder o ‘eu’ existencial, nada mais terei para pensar, ler ou escrever e a vida corporal será inútil para mim e um estorvo para as pessoas próximas.
Espero que mente e corpo morram simultaneamente; se um tiver que morrer primeiro, que seja o corpo. Quando a mente morrer, o corpo não saberá o que fazer.
MINHA LISTA DE DESCONHECIDOS
Quando jovem, … (Quando mesmo que fui jovem? Quando deixei de ser jovem? Resta alguma jovialidade em mim?) Bem… Quando ainda imaginava ser jovem, eu enfrentava qualquer parada: serviço pesado, serviço difícil, festas, conflitos e campanhas eleitorais. Para muitos, fiz diferença, colaborei; para a maioria, fui paisagem, um rosto anônimo; para alguns, fui estorvo, um incomodador.
Como disse aquele monge ao completar 86 anos, comecei com a ilusão que poderia mudar o mundo e acabei mudando um pouco em mim mesmo.
Tive durante muito tempo a pretensão de elucidar dúvidas, desvendar mistérios, conquistar pessoas por convencimento e de manter relações amigáveis insistindo em explicações. Ah! Ajudar as pessoas no aprendizado do que eu considerava importante e que considerava seria muito importante para elas. Observava a forma como as pessoas dirigiam, criticava os desmatadores e os depravados, orientava os esbanjadores, me preocupava com os telhados dos vizinhos, ria dos ridículos, … Enfim: cuidava da vida alheia.
Aí, durante um desgosto mais amargo, tive a ideia de iniciar minha lista de desconhecidos. Quando uma pessoa de minha rede de relações se mostrava resistente ou incomodada com minhas opiniões, quando os parceiros sabotavam meus esforços, quando uma pessoa me traia, quando alguém me ofendia, … A lista cresceu, mesmo usando doses de benevolência e permitindo, em alguns casos, uma segunda chance.
Nessa minha lista de desconhecidos, coloquei arrogantes, brigões, vingativos, espertos, estúpidos, caloteiros, hipócritas, dissimulados e/ou fingidos. Reduzi contatos, deletei mágoas, evitei aborrecimentos, parei de querer mudar quem não quer mudar, deixei caídos os que me empurraram e economizei desprezos. Deixei de gastar minhas energias e de empatar o meu tempo com ex-conhecidos.
Para os ainda-por-conhecer, dedico parte da minha atenção, com precaução. Porém, quando encontro um desses desconhecidos contabilizados, concentro esforços em neutralidade planejada. Como diz a gíria: “passo reto”.
Há tempo, escrevi o poema “Menos amigos, mais amizade”, que procuro sempre reler, para me manter crítico e prosseguir no meu processo de enxugamento.
MUDAR NA MUDANÇA
Podemos mudar de apartamento, casa, bairro, cidade, região, país, … Talvez, … de planeta…
Impulsionados por insatisfações, saturamentos, esgotamentos, tragédias, expulsões, aversões ou oportunidades.
Podemos deixar o indesejado, algo do que fomos, apelidos, relações, humilhações, perseguições, limitações espaciais ou emocionais.
Em busca de horizontes amplos, harmonia interna, familiar, social ou comunitária: melhores condições de vida.
Podemos mudar de residência e aproveitar para mudar de vida.
Ou, ingenuamente, carregar conosco idiossincrasias, ilusões, manias, comportamentos, …
Assumindo os mesmos papeis, repetindo hábitos prejudiciais, reconstruindo o desagradável…
Ou podemos aproveitar a mudança para mudar a nós mesmos, abandonando ‘verdades’, replantando esperanças e concretizando sonhos.