O prefixo latino ‘ad’ indica “movimento para, movimento em direção de, aproximação, diante de, junto a, ...” [Houaiss] Ad-miror, atus, sum: ad-mirar, intenção e ação consciente de mirar, de “fixar os olhos em, olhar longamente à distância, fazer pontaria”, se esforçar para atingir o ponto central, desenvolver acuidade, ... [Houaiss] *** Eu admiro o voo dos pássaros. Posso passar horas, no templo da floresta, con-templando os pássaros em suas ousadias e em suas habilidades voláteis, que representam a real liberdade. Admiro, apenas... não quero estar com eles no ar, não pretendo voar. Admiro os heróis; fujo de heroísmos. Prefiro ser normal, passageiro, substituível e livre de idolatrias. Jamais eterno. Meu corpo e minha mente são finitos. Talvez, minhas ideias se propaguem e sobrevivam ao meu sopro vital... Admiro o circo que está (des)armado aqui em frente. Admiro apenas. Por enquanto, sou plateia e auditoria. Logo, o circo seguirá seu espetáculo e eu permanecerei silvestre, parte da Natureza, convivendo com os bichos, plantando sementes. Admiro a Primavera. Todavia, o encanto dela está – exatamente – na impermanência, na fugidade das estações e dos ciclos cósmicos. Se, o tempo todo, fosse primavera, já estaríamos cansados do eterno florir. A beleza das flores começa na esperança, no saber esperar, que inclui semear, plantar, regar, cuidar e imaginar. E as esperanças vegetam durante os invernos. Procuro saber o que admiro; prefiro ter consciência do que vivo, do que quero continuar vendo de longe, do que quero viver integralmente no dia-a-dia. A beleza e a funcionalidade da vida estão na diversidade, na compreensão dos ciclos... semelhantes, porém, sempre modificados, diferentes em detalhes que fogem ao nosso entendimento. Depois de séculos, identificamos mudanças significativas. Se chovesse o tempo todo ou se nunca chovesse, as plantas seriam extintas. A monotonia mata. A monocultura se autodestrói. Inclusive, a monocultura literária. Viver para sempre seria a ‘morte de novas vidas’. A soberba humana pode pretender ser eterna; há quem acredite que sua estupidez seja insubstituível. O inverno e o morrer são tão importantes quanto a primavera e o nascimento. A ressurreição, então, seria a arrogância de renascer em detrimento de outras vidas, de se intrometer nas gerações futuras. A Terra já está superlotada de homo-deuses; para sobreviver, o planeta precisa que ocorram muitas mortes definitivas, para dar espaço a novas existências. Quero viver plenamente o meu agora com o máximo senso de realidade: essa consciência de que sou único, limitado e efêmero. 08.09.2020 – 15:41
Arquivo da categoria: Transitoridade
MORTE CONSCIENTE
Morremos no momento que tomamos consciência da morte. A falência dos órgãos vitais determina o término do processo biofísico; apenas, o desligar da máquina humana. Hoje (20.01.2023), eu morri. Isto é, tomei consciência da minha morte: da inutilidade de meus esforços, durante décadas, para construir estruturas habitacionais e estruturas culturais. Eu sou nada. Nada ficará. A floresta será derrubada, as aves silvestres serão presas ou abatidas, as fontes voltarão a secar, o dinheiro será gasto e as palavras serão dispersas ao vento. Eu é que, fantasma de mim mesmo, sobrevivi à minha morte, para contemplar a dissipação no meu mundo idílico. Como fantasma, me sinto bem mais leve... Viver é acreditar nas próprias ilusões.
ÂMAGO
Os velhos troncos, só no cerne, aprenderam a resistir às ventanias, aos temporais e às enxurradas. Viveram muito; porém, também eles cairão um dia. O cerne representa a solidez vegetal. Como os velhos troncos, fui perdendo o vigor aparente, as partes macias, a elasticidade tecidual. Vou me reduzindo, cada vez mais, à essência de mim mesmo. Sempre procuro e pratico a verdade, mesmo que demore a encontrar. As aparências e as gentilezas cederam lugar à objetividade, ao pragmatismo, ao essencial. Meus olhos ainda veem e, com calma, podem enxergar realidades; meus ouvidos ainda funcionam e a mente ainda elabora mapas de meus entornos sociais. Ainda consigo analisar o que acorre e posso prever, em parte, o que poderá acontecer. Tenho consciência de que o amanhã está mergulhado na dúvida. Atento, sem pressa e agindo conscientemente, ainda posso controlar meu corpo, administrar meu dinheiro, trabalhar e tomar decisões. Eu ainda percebo as possibilidades e sei o que quero. Às vezes, as tempestades testam minha estabilidade. Porém, as ameaças passam e, por enquanto, continuo no controle de minha vida.
O PORVIR E O POR VIR
Vivo uma vida singela, entre árvores e pássaros, ouvindo a música das cachoeiras, cultivando a horta e o jardim, usufruindo uma aposentadoria tranquila, que possibilita passar algumas horas lendo ou escrevendo.
Amanhã …?
Viverei como escritor-sitiante até quando perder o domínio sobre o corpo e sobre a mente; por enquanto, cuido da casa e do corpo e, com a ajuda do Vanderlei, consigo dar conta dos trabalhos de manutenção do Sítio Itaguá. Depois… quem sabe alguém que ame a natureza queira continuar a obra? Acredito que sempre haverá utópicos dispostos a ‘dar a vida pela natureza’.
Morrer…
Se a morte repentina me apagar, minha velhice será breve…. Caso tenha uma morte longa, dependerei de cuidadores que caibam no meu orçamento e de alguém que administre a situação.
Prefiro morrer ‘na luta’, peleando, de pé. Se acaso as pernas fraquejarem, continuarei a caminhar sobre muletas, rodas ou esteiras, pois, enquanto vivo, quero andar.
Pode a mente sofrer períodos de descontinuidade ou ser desligada definitivamente; sei que pode ocorrer. Quando isso acontecer, peço o favor: desliguem o corpo também. Quando perder o ‘eu’ existencial, nada mais terei para pensar, ler ou escrever e a vida corporal será inútil para mim e um estorvo para as pessoas próximas.
Espero que mente e corpo morram simultaneamente; se um tiver que morrer primeiro, que seja o corpo. Quando a mente morrer, o corpo não saberá o que fazer.
AUTOANÁLISE. AUTOCURA.
Consigo lidar com os limites da mente, do espírito. Basta uma dose de humildade e a firme decisão de aceitar a realidade. Tenho relativo controle sobre o campo psicológico. Invento esperanças, alimento ilusões, cancelo projetos, reinvento motivos para viver. Leituras e escrituras ajudam a curar feridas emocionais. Meditar, conversar, dialogar, … procedimentos que aliviam as decepções e podem fortalecer meu senso de realidade. No mundo físico, os limites são mais persistentes, mais teimosos. Mostram força e colocam as soluções depois do horizonte, além das minhas forças. A chuva, a seca, o calor, o frio, o vento, o corpo, … Os elementos naturais seguem o ritmo eterno e fico à mercê deles. Analiso meu corpo, o transportador de minha mente, o habitat de meu espírito. Tento otimizar os movimentos, administrar o funcionamento. Com dificuldades, porque meu corpo envelhece depressa, degenera. Ao contrário da mente, que se renova a cada incentivo, a cada estímulo, a cada carinho recebido, o corpo definha inexoravelmente. Autoanálise. Autopreservação. Autofinamento. A mente ativa governando um corpo em constante redução, enfraquecido. Busco meu fim. No fim, serei muitas ideias em um corpo frágil. Essa será a mais perfeita das imperfeições. A perfeição possível.
ADMIRAÇÃO
Eu admiro o voo dos pássaros. Posso passar horas, no templo da floresta, con-templando os pássaros em suas ousadias e em suas habilidades voláteis, que representam a real liberdade. Admiro, apenas... não quero estar com eles no ar, não pretendo imitar. Admiro os heróis; fujo de heroísmos. Prefiro ser normal, passageiro, substituível e livre de idolatrias. Jamais eterno. Meu corpo e minha mente são finitos. Talvez, minhas ideias se propaguem e sobrevivam ao meu sopro vital... Admiro os vizinhos. Admiro apenas. Prefiro ser plateia e auditório dos projetos e das realizações deles, enquanto continuo silvestre, como elemento da Natureza, convivendo com os bichos e plantando sementes. Admiro a Primavera. Todavia, o encanto dela está – exatamente – na impermanência, na fugidade das estações e dos ciclos cósmicos. Se, o tempo todo, fosse primavera, já estaríamos cansados do eterno florir. A beleza das flores começa na esperança, no saber esperar, que inclui semear, plantar, regar, cuidar e imaginar. E as esperanças vegetam durante os invernos. Procuro saber o que admiro; prefiro ter consciência do que vivo, do que quero continuar vendo de longe, do que quero viver integralmente no dia-a-dia. A beleza e a funcionalidade da vida estão na diversidade, na compreensão dos ciclos... semelhantes, porém, sempre modificados, diferentes em detalhes que fogem ao nosso entendimento. Depois de séculos, identificamos mudanças significativas. Se chovesse o tempo todo ou se nunca chovesse, as plantas seriam extintas. A monotonia mata. A monocultura se autodestrói. Inclusive, a monocultura literária. Viver para sempre seria a ‘morte de novas vidas’. A soberba humana pode pretender ser eterna; há quem acredite que sua estupidez seja insubstituível. O inverno e o morrer são tão importantes quanto a primavera e o nascimento. A ressurreição, então, seria a arrogância de renascer em detrimento de outras vidas, de se intrometer nas gerações futuras. O mundo já está superlotado de homo-deuses; para sobreviver, o Planeta Terra precisa que ocorram muitas mortes definitivas, para dar espaço a novas existências. Quero viver plenamente o meu agora com o máximo senso de realidade: essa consciência de que sou único, limitado e efêmero. *** O prefixo latino ‘ad’ indica “movimento para, movimento em direção de, aproximação, diante de, junto a, ...” Ad-miror, atus, sum: ad-mirar, intenção e ação consciente de mirar, de “fixar os olhos em, olhar longamente à distância, fazer pontaria”, se esforçar para atingir o ponto central, desenvolver acuidade, ... 8 de setembro de 2020 11:19
PENSAR NO IMPENSAR
Nada lembramos do que vivemos
– inconscientemente –
nos primeiros anos de vida.
.
Da infância à adolescência,
agimos mais por impulso
que por raciocínio lógico.
.
Aos poucos, vamos tomando consciência
de nossos acertos e de nossos erros
e passamos a refletir antes de fazer,
acreditando que construímos o destino
com nossas escolhas, sem responsabilizar
o azar ou a sorte por fracassos ou sucessos.
.
Se planejarmos o que iremos fazer
e analisarmos o que fizemos,
poderemos reduzir o volume de erros
e viver sem tantas decepções.
.
À medida que envelhecemos,
passamos a pensar mais sobre
o cada vez menos que podemos fazer.
Substituímos espontaneidade e ingenuidade
por responsabilidade crítica.
MUDAR NA MUDANÇA
Podemos mudar de apartamento, casa, bairro, cidade, região, país, … Talvez, … de planeta…
Impulsionados por insatisfações, saturamentos, esgotamentos, tragédias, expulsões, aversões ou oportunidades.
Podemos deixar o indesejado, algo do que fomos, apelidos, relações, humilhações, perseguições, limitações espaciais ou emocionais.
Em busca de horizontes amplos, harmonia interna, familiar, social ou comunitária: melhores condições de vida.
Podemos mudar de residência e aproveitar para mudar de vida.
Ou, ingenuamente, carregar conosco idiossincrasias, ilusões, manias, comportamentos, …
Assumindo os mesmos papeis, repetindo hábitos prejudiciais, reconstruindo o desagradável…
Ou podemos aproveitar a mudança para mudar a nós mesmos, abandonando ‘verdades’, replantando esperanças e concretizando sonhos.
ADMIRAÇÃO
Eu admiro o voo dos pássaros. Posso passar horas, no templo da floresta, con-templando os pássaros em suas ousadias e em suas habilidades voláteis, que representam a real liberdade. Admiro, apenas… não quero estar com eles no ar, não pretendo imitar.
Admiro os heróis; fujo de heroísmos. Prefiro ser normal, passageiro, substituível e livre de idolatrias. Jamais eterno. Meu corpo e minha mente são finitos. Talvez, minhas ideias se propaguem e sobrevivam ao meu sopro vital…
Admiro o circo que está (des)armado aqui em frente. Admiro apenas. Por enquanto, sou plateia e auditoria. Logo, o circo seguirá seu espetáculo e eu permanecerei silvestre, parte da Natureza, convivendo com os bichos, plantando sementes.
Admiro a Primavera. Todavia, o encanto dela está – exatamente – na impermanência, na fugidade das estações e dos ciclos cósmicos. Se, o tempo todo, fosse primavera, já estaríamos cansados do eterno florir. A beleza das flores começa na esperança, no saber esperar, que inclui semear, plantar, regar, cuidar e imaginar. E as esperanças vegetam durante os invernos.
Procuro saber o que admiro; prefiro ter consciência do que vivo, do que quero continuar vendo de longe, do que quero viver integralmente no dia-a-dia. A beleza e a funcionalidade da vida estão na diversidade, na compreensão dos ciclos… semelhantes, porém, sempre modificados, diferentes em detalhes que fogem ao nosso entendimento. Depois de séculos, identificamos mudanças significativas.
Se chovesse o tempo todo ou se nunca chovesse, as plantas seriam extintas. A monotonia mata. A monocultura se autodestrói. Inclusive, a monocultura literária.
Viver para sempre seria a ‘morte de novas vidas’. A soberba humana pode pretender ser eterna; há quem acredite que sua estupidez seja insubstituível.
O inverno e o morrer são tão importantes quanto a primavera e o nascimento. A ressurreição, então, seria a arrogância de renascer em detrimento de outras vidas, de se intrometer nas gerações futuras. O Planeta Terra já está superlotado de homo-deuses; para sobreviver, precisa que ocorram muitas mortes definitivas, para dar espaço a novas existências. Quero viver plenamente o meu agora com o máximo senso de realidade: essa consciência de que sou único, limitado e efêmero.