- A tolerância é semente de paz.
- Quem planta emoções colhe violência.
- A vaidade é pedra inútil que carregamos.
- Ao invés de viver a própria vida, muita gente quer viver a vida dos outros. Essa é a mais profunda das alienações.
- O dialético percebe o mundo como realidade em contínua transformação.
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AUTOANÁLISE. AUTOCURA.
Consigo lidar com os limites da mente, do espírito. Basta uma dose de humildade e a firme decisão de aceitar a realidade. Tenho relativo controle sobre o campo psicológico. Invento esperanças, alimento ilusões, cancelo projetos, reinvento motivos para viver. Leituras e escrituras ajudam a curar feridas emocionais. Meditar, conversar, dialogar, … procedimentos que aliviam as decepções e podem fortalecer meu senso de realidade. No mundo físico, os limites são mais persistentes, mais teimosos. Mostram força e colocam as soluções depois do horizonte, além das minhas forças. A chuva, a seca, o calor, o frio, o vento, o corpo, … Os elementos naturais seguem o ritmo eterno e fico à mercê deles. Analiso meu corpo, o transportador de minha mente, o habitat de meu espírito. Tento otimizar os movimentos, administrar o funcionamento. Com dificuldades, porque meu corpo envelhece depressa, degenera. Ao contrário da mente, que se renova a cada incentivo, a cada estímulo, a cada carinho recebido, o corpo definha inexoravelmente. Autoanálise. Autopreservação. Autofinamento. A mente ativa governando um corpo em constante redução, enfraquecido. Busco meu fim. No fim, serei muitas ideias em um corpo frágil. Essa será a mais perfeita das imperfeições. A perfeição possível.
PARTE DO PROBLEMA
Eu sofria ataques verbais dos vizinhos, sem compreender a razão de tão intensas e contínuas agressões. Conversando com os filhos, um deles afirmou que eu estava provocando a situação. No primeiro momento, senti abalo emocional: considerei que até o filho estava contra mim. Depois, refleti: ele falou isso por um motivo. Procurei inverter o meu ponto de vista, experimentar outros olhares, tentar ver por outro ângulo. Imaginar o que meu filho via. Então, conclui: minha afabilidade, meus sorrisos silenciosos e minha vontade de ajudar criavam barreiras e, até, aversão. Afinal, eu era ‘de fora’; o que estaria querendo? “Ensinar a gente viver do jeito dele?” Minhas palavras eram recebidas como desaprovação do modo de vida dos ‘nativos’. Eu era ‘de fora’, não comungava dos valores deles, como criar bois atados em cordas à beirada de estradas, proliferar cães e gatos, jogar lixo no rio, ... Minhas opiniões, atitudes e crenças causavam desconfortos e desencadeavam reações agressivas. Queriam ‘me expulsar’. Assim, eles estariam livres de ‘críticas delicadas’ e de orientações ‘urbanas’ (“pensa que vive na cidade”), como ensinar pessoas a ler e a escrever, aparar a relva, cultivar jardim, plantar flores, construir canteiros na horta em retângulos sob medida, “fazer trabalho de mulher”, perder tempo plantando árvores, ... Como o Plínio Schmidt me alertou: “Andam dizendo por aí que o senhor é um louco. Enquanto todo mundo luta pra limpar os terrenos, o senhor planta mato.” Minhas tentativas de conversar, minha disponibilidade, meus desejados diálogos sem entrar no jogo verbal de revidar, sem responder à altura, sem ter uma “atitude de homem”. Meu comportamento cortês agredia as pessoas, minha tolerância com homossexuais e com negros depunha contra valores ‘consagrados’; meu ateísmo assustava. Ou seja, eu era parte do meu problema. Ou pior: eu causava problemas. Eu escrevia frases filosóficas no quadro pendurado na varanda. E a maioria deles despreza a leitura ou nem sabe ou não quer ler... Eu escrevo livros; “Vai ver que tá escrevendo da gente...”. Meu comportamento, sem que eu tivesse consciência disso, atraia o ódio dos ‘normais’. Ao longo de dezesseis anos, esporadicamente, sofri tempestades de palavrões e de acusações infundadas do vizinho, que, talvez, esteja indignado com meu silêncio complacente, com minha ‘educação exagerada’. “Tem gente que estuda a vida intera e não aprende a ajudá quem percisa.” “Bicha covarde. Froxo. Se iscode atráis da janela e da muié, foge pra banda de lá do rio.” Pesquisei e encontrei alguns ensaios sobre a aversão aos benevolentes e aos afáveis. Afável? Uhhhmmmm! Afável... Seria falta de atitudes viris? Falta de capacidade de enfrentamento? Covardia? Enfim, um ‘homem frouxo’... Então, querer a paz, querer viver em harmonia, seria agressivo aos belicosos? Fugir das competições, das encrencas e dos riscos sociais seria uma provocação para os empreendedores, para os destemidos? Sou um franguinho manso que se encolhe a cada bicada? Meu desejo de ‘ficar quieto no meu canto’ agride os competidores? Meu silêncio incomoda os que gritam? Percebo que essa minha afabilidade ofende as pessoas... que me atacam... e eu me encolho... Ao fugir de polêmicas, de confusões e de brigas, eu provoco a ira deles. Escolhi me retrair, abdicar da convivência comunitária e permanecer calado, sem contextualizar situações e sem relatar meus sentimentos. Convicto de que sou parte dos problemas que causo, passei a usar essa dúvida em minhas análises de conjuntura e nas solicitações de aconselhamento. Por esse ponto de vista, vejo que a maioria dos problemas persiste porque as pessoas se sentem vítimas condescendentes; não se veem como parte do problema e continuam agindo de boa-fé, crentes que ‘fazem o bem’. Acredito que o reconhecimento de que somos parte dos problemas pode contribuir na solução das nossas dificuldades afetivas e nas melhorias de nossas relações sociais.
ADMIRAÇÃO
Eu admiro o voo dos pássaros. Posso passar horas, no templo da floresta, con-templando os pássaros em suas ousadias e em suas habilidades voláteis, que representam a real liberdade. Admiro, apenas... não quero estar com eles no ar, não pretendo imitar. Admiro os heróis; fujo de heroísmos. Prefiro ser normal, passageiro, substituível e livre de idolatrias. Jamais eterno. Meu corpo e minha mente são finitos. Talvez, minhas ideias se propaguem e sobrevivam ao meu sopro vital... Admiro os vizinhos. Admiro apenas. Prefiro ser plateia e auditório dos projetos e das realizações deles, enquanto continuo silvestre, como elemento da Natureza, convivendo com os bichos e plantando sementes. Admiro a Primavera. Todavia, o encanto dela está – exatamente – na impermanência, na fugidade das estações e dos ciclos cósmicos. Se, o tempo todo, fosse primavera, já estaríamos cansados do eterno florir. A beleza das flores começa na esperança, no saber esperar, que inclui semear, plantar, regar, cuidar e imaginar. E as esperanças vegetam durante os invernos. Procuro saber o que admiro; prefiro ter consciência do que vivo, do que quero continuar vendo de longe, do que quero viver integralmente no dia-a-dia. A beleza e a funcionalidade da vida estão na diversidade, na compreensão dos ciclos... semelhantes, porém, sempre modificados, diferentes em detalhes que fogem ao nosso entendimento. Depois de séculos, identificamos mudanças significativas. Se chovesse o tempo todo ou se nunca chovesse, as plantas seriam extintas. A monotonia mata. A monocultura se autodestrói. Inclusive, a monocultura literária. Viver para sempre seria a ‘morte de novas vidas’. A soberba humana pode pretender ser eterna; há quem acredite que sua estupidez seja insubstituível. O inverno e o morrer são tão importantes quanto a primavera e o nascimento. A ressurreição, então, seria a arrogância de renascer em detrimento de outras vidas, de se intrometer nas gerações futuras. O mundo já está superlotado de homo-deuses; para sobreviver, o Planeta Terra precisa que ocorram muitas mortes definitivas, para dar espaço a novas existências. Quero viver plenamente o meu agora com o máximo senso de realidade: essa consciência de que sou único, limitado e efêmero. *** O prefixo latino ‘ad’ indica “movimento para, movimento em direção de, aproximação, diante de, junto a, ...” Ad-miror, atus, sum: ad-mirar, intenção e ação consciente de mirar, de “fixar os olhos em, olhar longamente à distância, fazer pontaria”, se esforçar para atingir o ponto central, desenvolver acuidade, ... 8 de setembro de 2020 11:19
Reflexão
Como não tenho permissão para abandonar o espetáculo, me esforço para aprender o jogo da vida.
A DIALÉTICA DA VIDA
A manhã, ao fornecer a luz,
rompe o repouso da noite;
desperta o aconchego do sono.
.
A alegria da primavera
está impregnada de dor,
porque a flor que abre
e o ramo que cresce
precisam romper a si mesmos
para superar o corpo que foram
durante o tempo de recolhimento,
tempo de hibernação.
.
O despertar da vida,
de aparente alegria,
traz em si
o rompimento do próprio ser
para que ele possa ser mais…
.
A magia da vida está
em entender os ciclos vitais,
a alternância das estações,
a importância própria de cada momento,
que é único e necessário para o seguinte,
que não consegue ser mágico por si só,
por ser apenas um passo a mais
no caminho do todo indivisível
prazer de viver como pessoa feliz.
.
A própria morte
traz dentro de si a vida,
pois, a saudade que nos invade
vem grávida da sabedoria de quem se foi,
da consciência de que tudo é efêmero
e de que precisamos viver intensamente
o momento presente,
valorizando as coisas simples e as pessoas,
porque, da vida, só lembraremos
da magia dos encontros humanos.
.
A alegria e a dor são
partes de um todo perfeito,
que alterna sofrimento e prazer,
na construção da vida.
.
A consciência dessa lógica
nos faz artífices do dia que nasce
e da primavera que floresce.
Recontagem de ÚLTIMA TRAVESSIA
Ouvi como anedota. Entretanto, o cenário, o tema e a insolência para com o homem humilde provocaram em mim uma reação ética e uma reflexão filosófica.
Um barqueiro ganhava seu sustento transportando pessoas para a outra margem do imenso rio. Não havia pontes. Era o único meio de transporte disponível. Em geral, transportava pessoas conhecidas, moradores das redondezas ou alguém que queria visitar algum familiar que morava além da outra margem.
Porém, num final de tarde, um homem com aspecto muito diferente dos ribeirinhos contratou uma travessia. As roupas e a pasta demonstravam ser uma pessoa da cidade. Mais que isso, cheio de si, parecia orgulhoso, cheio de si, semostrador.
Logo que a canoa saiu do embarcadouro, perguntou:
– Você conhece a Grécia?
– Grécia? Ela mora por aqui?
– Não, não. Não é uma mulher. A Grécia é um país distante e muito importante, porque foi lá que nasceu a Filosofia. Você deveria conhecer. Você não sabe o que está perdendo…
O humilde barqueiro baixou a cabeça. O objetivo dele era bem simples: levar pessoas de uma margem à outra.
– Você sabe Filosofia?
O barqueiro continuou remando, desinteressado dessa outra… possível … Seria outra nação? Seria uma mulher? Uma cidade?
Mesmo entendendo o silêncio e percebendo a inutilidade de lições, o homem explicou:
– A Filosofia investiga os princípios, os fundamentos e as essências da realidade imanente. Você não sabe o que está perdendo…
O barqueiro nem deu ouvidos; permaneceu atento à força da correnteza e aos movimentos arriscados do passageiro que podiam jogar água pra dentro da embarcação.
– Você sabe por que o avião consegue voar?
Pobre homem!!! Nem sabia da existência de aviões… Via muitos pássaros voarem… Até as folhas secas voam levadas pelo vento… Mas… avião… nem imaginava…
– Não. Não sei, não.
– Você não sabe o que está perdendo…
O barqueiro se sentiu mais pobre ainda… Nada possuía e ainda estava perdendo muita coisa…
– Você já leu Lucas Visentini?
– Lucas, eu conheço. Mas, ler o Lucas… Lá isso eu não sei.
– Você não sabe o que está perdendo…
O homem estava mesmo espezinhando o seu transportador.
– Qual a voltagem da energia elétrica por aqui?
O barqueiro ficou ainda mais confuso. Energia, ele até sabia o que era… Voltagem? Seria a volta de alguém? De dona Elétrica, talvez… Tem cada nome por aí…
– Nunca ouvi falar…
– Você não sabe o que está perdendo…
E assim, enquanto o barquinho singrava as turbulentas e agressivas águas do imenso rio, seguiu o desdenhoso interrogatório.
Além dos perigos naturais de se navegar a imensidão do rio em uma minúscula canoa, um iminente naufrágio ameaçava a vida de ambos, por causa da imprudência do passageiro.
No limite de sua paciência, o barqueiro perguntou agressivamente:
– O senhor sabe nadar?
– Nunca precisei aprender… – ironizou.
– Se continuar enchendo a igara de sabença e saracoteando sem parar, a canoa vai virar e o senhor vai perder tudo o que sabe. Até a própria vida…
PENSAR NO IMPENSAR
Nada lembramos do que vivemos
– inconscientemente –
nos primeiros anos de vida.
.
Da infância à adolescência,
agimos mais por impulso
que por raciocínio lógico.
.
Aos poucos, vamos tomando consciência
de nossos acertos e de nossos erros
e passamos a refletir antes de fazer,
acreditando que construímos o destino
com nossas escolhas, sem responsabilizar
o azar ou a sorte por fracassos ou sucessos.
.
Se planejarmos o que iremos fazer
e analisarmos o que fizemos,
poderemos reduzir o volume de erros
e viver sem tantas decepções.
.
À medida que envelhecemos,
passamos a pensar mais sobre
o cada vez menos que podemos fazer.
Substituímos espontaneidade e ingenuidade
por responsabilidade crítica.
ADMIRAÇÃO
Eu admiro o voo dos pássaros. Posso passar horas, no templo da floresta, con-templando os pássaros em suas ousadias e em suas habilidades voláteis, que representam a real liberdade. Admiro, apenas… não quero estar com eles no ar, não pretendo imitar.
Admiro os heróis; fujo de heroísmos. Prefiro ser normal, passageiro, substituível e livre de idolatrias. Jamais eterno. Meu corpo e minha mente são finitos. Talvez, minhas ideias se propaguem e sobrevivam ao meu sopro vital…
Admiro o circo que está (des)armado aqui em frente. Admiro apenas. Por enquanto, sou plateia e auditoria. Logo, o circo seguirá seu espetáculo e eu permanecerei silvestre, parte da Natureza, convivendo com os bichos, plantando sementes.
Admiro a Primavera. Todavia, o encanto dela está – exatamente – na impermanência, na fugidade das estações e dos ciclos cósmicos. Se, o tempo todo, fosse primavera, já estaríamos cansados do eterno florir. A beleza das flores começa na esperança, no saber esperar, que inclui semear, plantar, regar, cuidar e imaginar. E as esperanças vegetam durante os invernos.
Procuro saber o que admiro; prefiro ter consciência do que vivo, do que quero continuar vendo de longe, do que quero viver integralmente no dia-a-dia. A beleza e a funcionalidade da vida estão na diversidade, na compreensão dos ciclos… semelhantes, porém, sempre modificados, diferentes em detalhes que fogem ao nosso entendimento. Depois de séculos, identificamos mudanças significativas.
Se chovesse o tempo todo ou se nunca chovesse, as plantas seriam extintas. A monotonia mata. A monocultura se autodestrói. Inclusive, a monocultura literária.
Viver para sempre seria a ‘morte de novas vidas’. A soberba humana pode pretender ser eterna; há quem acredite que sua estupidez seja insubstituível.
O inverno e o morrer são tão importantes quanto a primavera e o nascimento. A ressurreição, então, seria a arrogância de renascer em detrimento de outras vidas, de se intrometer nas gerações futuras. O Planeta Terra já está superlotado de homo-deuses; para sobreviver, precisa que ocorram muitas mortes definitivas, para dar espaço a novas existências. Quero viver plenamente o meu agora com o máximo senso de realidade: essa consciência de que sou único, limitado e efêmero.
PEDIDA
Ao finalizar o curso de pós-graduação em psicopedagogia clínica, promovemos uma confraternização em que cada um deveria falar ‘algumas palavras como despedida’. Aproveitei para refletir sobre o significado da palavra despedida. DES PEDIR: desfazer o pedido.
“O que queremos dizer ao pronunciar o vocábulo ‘despedida’? Que desejamos desfazer nossos pedidos? Que desistimos das perguntas, das respostas e dos auxílios pendentes? Que abdicamos dos nossos interesses?
Realmente, após a partida de uma pessoa, quando dela nos separamos definitivamente, a ela, não mais pedimos favores, nem opiniões. É isso mesmo que nós queremos fazer a partir de hoje? Não mais procurar os colegas e os professores para pedir opiniões e ajudas? Se assim procedermos, será porque não aprendemos a lição psicopedagógica maior.
E, durante o curso, o que perguntamos ou pedimos aos colegas? E o que oferecemos? Ao estudar psicopedagogia, estávamos procurando compreender as dificuldades de aprender… só dos outros?
Como lidamos com as nossas dificuldades de aprender? O que aprendemos? Poderíamos fazer um inventário das nossas aprendizagens nesse grupo? O que aprendemos sozinhos? O que aprendemos com as pessoas que concordaram com nossas ideias? O que aprendemos com as pessoas que se opuseram às nossas verdades?
Penso que aprendemos mais com os que tiveram a coragem e a amizade de quebrar nossos espelhos… espelhos viciados e coniventes, que refletem apenas a parte da realidade que aceitamos. Espelhos que refletem nossas máscaras.
Se, nesse curso, fomos ajudados a nos ver um pouco mais parecidos com o que somos, agora, poderemos trabalhar as nossas próprias dificuldades de aprender; de saber: QUEM SOU EU?
E, psicopedagogicamente, sabemos que a aprendizagem tem seu tempo de gestação. Não de uma gestação biológica; gestação de ideias, tempo para aprender, período de uma gestação cultural, intercalada de períodos de latência, de vazios e de retrocessos. Sabemos que a aprendizagem não é automática e instantânea. Que podemos chegar ao conhecimento em um dia, em uma semana, em um mês, em um ano, no fim da vida … ou nunca. Que cada um tem seu ritmo e seu prazo. Talvez, no futuro, nos surpreenderemos com descobertas concebidas nesses catorze meses de curso, entretanto, com períodos de incubação diversos.
Nem todas as sementes da Turma ’J’ já nasceram; algumas estão em processo, outras ainda não caíram no chão da vida.”
22maio2002