Você pede desculpas. Eu não tenho poderes para anular tuas culpas e, muito menos, poder para remir teus crimes. Não há como emendar bananeiras ou desfazer os cortes, os ferimentos e a morte de árvores; não consigo ressuscitar vegetais. Seria utópico (e é) se livrar das agressões apenas confessando as culpas. Você veio reaver as armas do crime, sem trazer de volta os objetos que sumiram, destruídos ou jogados para o fundo do lago do esquecimento. Você não consegue devolver as horas de sono consumidas pela dúvida e pela insegurança decorrente da tua maldade ingênua. Você não consegue devolver a confiança em humanos; você não consegue remendar a paz dilacerada e, muito menos, restituir vida.
Arquivo da categoria: Terrorismo
OS EXPLORADORES
Muito ativos desde pequenos,
choram por qualquer coisa,
exigem dedicação integral e
conseguem a atenção cobrada.
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Só que começam engatinhar,
exploram o quarto, a casa, o quintal.
Remexem tudo e seguem adiante…
sempre sem limites.
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Da mãe,
exigem alimento,
carinhos, o infinito e a eternidade;
do pai,
cobram trabalho extenuante,
segurança e presentes;
das demais pessoas,
ocupam o centro das atenções.
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Mesmo assim, reclamam de tudo.
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Para ampliar a exploração,
recebem madrinhas e padrinhos,
fontes inesgotáveis
de elogios e de mimos.
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Depois de explorar o pai, a mãe,
a família, os padrinhos, os avós,
os irmãos e os vizinhos, frequentam
creches, escolas e academias, onde
continuam exigindo privilégios:
exploram colegas e professores.
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Crescem explorando pessoas,
comunidades, clientes, governos
e todos os que deles se aproximam.
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Se apossam da natureza
como predadores insaciáveis,
derrubando árvores, matando animais,
queimando os resíduos orgânicos
e, por último, vendem
as pedras que restam no solo.
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Envenenam as lavouras,
as pastagens, os pátios de casa,
os rios, as lagoas, o mar e o ar.
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Seguem explorando os vizinhos,
as terras dos vizinhos,
as matas dos vizinhos,
as criações dos vizinhos,
os transportes dos vizinhos,
a amizade dos vizinhos,
a boa-fé dos vizinhos e
acabam esgotando
a paciência dos vizinhos.
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Depois de sugar a mãe, o pai,
a família, a comunidade,
a natureza e os mananciais de água,
passam a explorar as verbas públicas
e os espaços sociais…
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Como gafanhotos humanos,
vão desfolhando a vida;
por onde passam,
só restarão esqueletos ao vento.
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Exploradores
são pessoas bem atuantes,
que vivem sem limites,
se apossando de tudo
o que estiver disponível,
devorando o que encontram,
exigindo ‘colaboração’ dos outros,
sem nunca colaborar,
e ‘ficam muito brabos’ quando
os desejos e a voracidade deles
não forem atendidos.
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Exploradores desdenham e combatem
a ordem, os limites, as regras,
os valores morais,
as ações comunitárias,
o trabalho coletivo,
a preservação da natureza,
o ajardinamento de ruas e praças,
os cuidados com a casa,
a lealdade com as pessoas e
o respeito com as diferenças.
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Exploradores não perguntam
‘Eu posso entrar?’,
‘Eu posso pegar uma fruta?’,
‘Eu posso ajudar nesse trabalho?’,
‘Como você se sente?’,
‘O que você espera de mim?’, …
.
Quando casam,
os exploradores já são
especialistas em exploração
e dominam completamente
as esposas, os sogros, os cunhados,
os filhos, os parentes, as instituições.
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Querem ser servidos,
‘ter tudo à mão’,
sem questionamentos
ou reclamações.
CÂNCER EM MAMA
Comandantes de instituições religiosas criam interdições (muitas vezes, incompreensíveis), que colocam névoas intelectuais entre as pessoas, dificultando a comunicação e criando o obscurantismo. Somos vítimas, “… seres humanos sacrificados a uma divindade ou em algum rito sagrado.”¹ Vivemos sob os constrangimentos morais dos “bons costumes” decorrentes de estratégias de dominação dos humildes por líderes ‘bondosos’, espertos e prepotentes.
Os dogmas e os mitos descrevem eventos metafísicos, criados por discursos da classe dominante e perpetuados pela oralidade plebeia ágrafa e subservil. As elites governantes inventam categorias sobrenaturais para justificar as transgressões às regras morais usadas para subjugar os súditos. Ou seja, controlam o povo com normas que se permitem burlar para dar plena vazão à corrupção, à devassidão, à libertinagem, à perversão e à exploração de seus semelhantes, como escravos ou fregueses de “determinada paróquia ou freguesia”¹.
Os semideuses da mitologia grega (satiros) e romana (faunos), como os demais semideuses em todos os impérios, leigos ou religiosos, permitiam a si o que proibiam aos comandados. Homens com cabeça de bode (que pensavam como um bode de alta potência sexual) que se permitiam a si mesmos (apenas a si mesmos…) dispensar o bom senso e, sem escrúpulos, liberar os instintos animalescos para praticar vícios e abusos.
A dominação masculina começa ao anexar as mulheres pela linguagem: a palavra ‘homens’ designando mulheres e homens, as fêmeas e os machos da espécie Homo Sapiens. Mitos e regras impostas por homens (masculinos, não-femininos) que, em casos extremos, transformam meninas, moças e mulheres em animais domésticos. O machismo permeia a cultura colonial europeia. (Desconheço os comportamentos de gênero nas demais culturas. E, como não conheci e nem convivi com sociedades matriarcais, fico curioso sobre os comportamentos do femealismo.)
Os tabus influenciam os costumes e, consequentemente, a linguagem. O uso de eufemismos e de jargões camufla a realidade objetiva (camuflar = disfarçar, enganar), gerando escrúpulos infundados, inquietação mental, subserviência, constrangimento e interdição cultural ou religiosa. A hipocrisia imposta pela língua condena, por tabuísmo, palavras comuns, triviais e vulgares. Ou seja, demonializa objetos naturais e ações corriqueiras do nosso cotidiano.
Podemos tomar como exemplo o generalizado uso da expressão “câncer de mama”.
O tabu exige que, ao falarmos de mamas, usemos o ‘bom senso’, eufemismos, palavras não interditadas pela MORAL: ‘peito’ ou ‘seio’. “Deu o peito ao bebê.” “Tem o peito pequeno.” “Estava com o seio à mostra.” “Machucou o seio.”
Em anatomia, identificamos ‘peito’ como “porção anterior ou ventral do tórax”¹. Daí decorre o absurdo de afirmar que a mulher tem dois peitos. (E as porcas, então, teriam entre doze e dezesseis peitos???) Os rapazes também têm um único peito e duas mamas, em geral, pouco desenvolvidas.
No mesmo dicionário, podemos encontrar que ‘seio’ significa “parte do pescoço e do peito feminino que pode ficar descoberto”¹. (Os humanos machos e machos ‘humanos’ permitem essa sedução…) Ou “parte interna”¹, “cavidade”¹. Nas aulas de Anatomia, aprendi que o ‘seio’ de qualquer pessoa estava localizado sobre o osso esterno, entre as duas mamas. De homens e de mulheres.
Por outro lado, deslembro de ter ouvido expressões como ‘espinho de pé’, ‘câncer de cabeça’, ‘câimbra de perna’, ‘dor de coluna’, ‘cólica de rim’, ‘cólica de útero’, ‘afta de boca’, … Em geral, ouço falar ‘espinho no pé’, ‘câncer na cabeça’, ‘câimbra na perna’, ‘dor na coluna’, ‘cólica nos rins’, ‘cólica no útero’, ‘afta na boca’.
Então, talvez, o mais correto (e menos dissimulado) seria dizer ‘câncer em uma mama’, ‘câncer nas mamas’ ou ‘câncer nas duas mamas’.
Mesmo assim, lamentável que as mamas só possam vir a público quando a mulher já está doente.
¹ Dicionário Eletrônico Houaiss