Félix passava a maior parte do tempo sentado no velho sofá da sala hipnotizado pelas imagens e pelo som da televisão. Os assuntos e os fatos eram sempre novos, porque ele esquecia tudo em minutos. Emocionava-se instantaneamente; esquecia imediatamente. Por isso, tudo era novidade. Até a aparição de um dos netos, que ele olhava com curiosidade, pois, na sua mente, não havia registros daquele personagem. Aliás, poderia ter, porém, o avô não encontrava os registros mnemônicos.
Passava horas babando pelos cantos da boca, agitado, excitado; as emoções estremeciam a velha carcaça a cada nova aparição feminina. As borrachas do sofá sofriam com os corpomotos, sismos intermitentes da tensão corporal. Esquecia do mundo. Aliás, de nada lembrava.
A esposa passava o dia em vigília. Preparava as refeições com um olho nas panelas e o outro no marido desmiolado. A mulher ia ao banheiro na correria, aproveitando os momentos em que ele estava encantado com alguma ninfa virtual. Até para atender quem batesse à porta, caminhava de ré, pois o caminho era mais estável que o pai de seus filhos.
Conceição – por ter concebido os filhos dele – prestava os serviços de esposa, de acompanhante e de enfermeira, sem reclamar e, até, com certo humor. Inicialmente, sofreu ataques de ciúme, como os havia sofrido desde que casara e acompanhava as investidas do farmacêutico, especialmente, quando aplicava injeções nas nádegas de suas vizinhas.
Porém, logo tomou consciência de que Félix nem mesmo sabia o que fazia. Deixou de levar a sério as babações, os acenos e os beijinhos jogados para o aparelho de TV. Às vezes, Conceição entrava na brincadeira, sorria para ele, piscava malícias, jogava beijos e perguntava:
— Qué casá comigo?
E ele, com os olhos vertendo ternuras:
— Pode ser…